quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Tiro Letal no RJ

Negociar é sempre primeira opção

Oficiais formados no Bope tentaram, antes do tiro fatal, convencer bandido a se entregar
Rio - Em sua primeira ação como negociador, o capitão Jaguaribe Nascimento, de 29 anos, foi o braço direito do comandante do 6º BPM (Tijuca), Fernando Príncipe, na tentativa de salvar a refém Ana Cristina. Apesar de estar só há quatro meses na unidade, Nascimento carrega no currículo o título de ‘caveira’ do Batalhão de Operações Especiais (Bope). “Uma vez caveira, sempre caveira. A gente nunca perde a essência”, orgulha-se.

Para entrar na tropa de elite da PM, o capitão Nascimento seguiu os passos do irmão, o ‘caveira’ Uirá, responsável pelas negociações durante o sequestro do ônibus 499, em 2005, em Nova Iguaçu, Baixada Fluminense. Na ocasião, 55 passageiros reféns foram libertados. “Ele foi a minha referência”, afirma. Durante o tempo que passou com a missão de convencer Sérgio Ferreira Pinto Júnior a se entregar, Nascimento conta que o pior momento foi quando o bandido retirou o pino da granada. “Ele estava transtornado e disposto a tudo. Exigia o tempo todo que eu dirigisse um carro para que conseguisse fugir”.

Para Nascimento, o maior objetivo era a rendição do criminoso sem morte. Mas, desta vez, não foi possível. A certeza de que tinha feito o melhor veio com o abraço da vítima, na delegacia. “Ali tive a certeza de que nosso trabalho foi correto. Perdemos uma vida, mas salvamos outra”, analisa. Nascimento fez parte do grupo de assalto tático do Bope, um dos núcleos que compõem a Unidade de Intervenção Tática (UIT), que reúne 64 policiais, entre negociadores, atiradores de elite e de resgate de reféns.

Para se tornar um sniper, é necessário curso de um mês, com avaliação técnica e psicológica. Depois, os treinamentos são obrigatórios e duram em média cinco anos. Entre as armas utilizadas, há fuzis, adaptados com lunetas e miras especiais, carregados com munição capazes de atingir alvo a 400 metros.

Em ações com reféns, os primeiros a atuar são os negociadores. Eles são os responsáveis por tentar a rendição do criminoso. Enquanto isso, os atiradores de elite são posicionados. O disparo letal só é feito após todas as alternativas de negociações se esgotarem. Ontem, o sniper foi o major João Busnello, que atirou após autorização do coronel Fernando Príncipe. O comandante, que esteve à frente do Bope por três anos, também tem formação de negociador, num curso em Israel.


O ‘caveira’ atirador:
‘Não foi a ocorrência mais difícil da minha vida, apenas fui preciso'

Rio - Especialista em tiros de precisão, o major João Jaques Busnello, 39 anos, acredita que um bom atirador deve treinar sempre. No último fim de semana, ele e o major Maycon, que o acompanhou na ação de ontem, estiveram no estande de tiro de Gericinó, Zona Oeste, para ‘calibrar’ os fuzis, onde fizeram mais de 400 disparos. “Estamos sempre preparados para isso”, diz. “Não foi a ocorrência mais difícil da minha vida, apenas fui preciso”, atesta.
Major Busnello: ‘Acredito em Deus, mas temo os homens’.

Com 16 anos de Polícia Militar, Busnello nasceu em Iraí, cidade do interior do Rio Grande do Sul, onde seus pais trabalhavam como lavradores. Chegou ao Rio aos 14 anos, com o objetivo de largar as enxadas para sempre: “Estudei, me formei, e adoro o que faço: trabalhar na PM”.
Ao ingressar na corporação, em 1993, Busnello traçou uma meta: fazer parte da elite da PM. De 2002 a 2007, serviu no Batalhão de Operações Especiais (Bope), onde tornou-se um ‘caveira’, grupo de policiais que passa pelo rigoroso Curso de Operações Especiais (COE). Atirador de elite, passou a chefiar o grupamento de tiros de precisão. “Sem dúvida, é preciso muita frieza e concentração”, revela.

No tiro de ontem, Busnello usou um fuzil brasileiro parafal 7.62mm, com luneta telescópica. O mesmo que levou a Gericinó semana passada. Em 2007, o oficial pediu para deixar o Bope, após desentendimento com outro oficial. Busnello integrava o grupo de policiais contrário ao filme ‘Tropa de Elite’, sobre o batalhão. Ele passou a chefiar o Serviço Reservado do 5º BPM (Praça da Harmonia), comandado por outro ‘caveira’, coronel Edval Camelo.

O major esteve à frente do Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe), onde foi acusado de lesão corporal dolosa, em maio. Ele teria tentado facilitar a entrada de pessoas sem ingresso e agredido um funcionário da Suderj. “Fui vítima desse caso, mas infelizmente a mídia não me procurou e revelou apenas a decisão do juiz”, lamentou. Leitor voraz, Busnello terminou de ler ‘O Povo Brasileiro’, de Darcy Ribeiro. “Somos miscigenados e esse sistema de cotas quer nos segregar, separar”, opinou. Casado, pai de um filho, Busnello não tem religião: “Acredito em Deus, temo os homens”.

Um comentário:

  1. O desfecho do caso através do "tiro de misericódia" fez-se por uma ação plenamente justificável, humana e juridicamente. De outra forma não poderia agir o Estado após se esgotarem todas as tentativas de rendição do agressor. Agora, transformar o sucesso da ação em uma glória pessoal fere os princípios condicionantes da ação de polícia. Mister se faz a preservação absoluta do agente responsável pelo tiro. Pensar que o nobre oficial chefiou o "serviço reservado" da PM carioca. Clássico contra-senso. A aparição do Major Busnello em rede nacional pode lhe render dissabores.
    Eber Alexandre

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