quarta-feira, 21 de março de 2012

TAP – MITOS E VERDADES

Elson Matos da Costa, Delegado Geral de Polícia, Coordenador/Professor de TAP – Técnicas de Ação Policial

Para que possamos ter um entendimento mais abrangente e da importância do que é o TAP – Técnicas de Ação Policial – disciplina constante da malha curricular da ACADEPOL/MG precisamos entender como funciona um confronto armado. Nos últimos meses, diversos policiais civis foram feridos com maior ou menor gravidade em ação policial quando a absoluta falta de treinamento acabou por quase vitimar alguns pais de família.

O tiro policial em nada guarda semelhança ao exame, por exemplo, que se faz para tirar o porte de arma. Neste, alguém postado numa linha é determinado que se municie o carregador, coloque-o na arma e alimentar que é a função de colocar uma munição na câmara e assim estar pronto para efetuar o disparo. Um alvo postado a alguns metros, imóvel se prepara para receber os impactos que porventura o vierem a alvejá-lo. É dado então ordem para que se faça o disparo. O candidato faz a visada calmamente, fecha um dos olhos, enquadra massa, alça de mira e o centro do alvo. Lentamente vai pressionado o gatilho até que acontece o disparo. Caso a visada tenha sido feito de forma correta o tiro sairá perfeito com o acerto no centro do alvo.

Esta é a forma de se começar a aprender a trabalhar com arma de fogo. No entanto este é apenas um primeiro passo para aqueles que irão utilizar do armamento como uma forma de trabalho e que será decisivo em determinadas ocasiões como entre a sua vida ou o seu óbito. Assim as técnicas aprendidas no início com certeza deverão ser utilizadas posteriormente, no entanto estas irão avançar para que o treinamento tenha eficácia quando forem utilizadas na vida real. Alguns dos manuseios aprendidos inicialmente novamente serão repetidos á exaustão no TAP para que se torne mecanizada a ação do policial no sentido de que mesmo diante de um alto estresse, que é o confronto armado, ele venha a agir de conformidade como treinou.

Podemos exemplificar com relação ao manuseio de uma Pistola .40 onde o aspirante teve o seu primeiro contato com este tipo de armamento e teve que municiar, carregar e alimentar a arma e logo após efetuar um disparo. Este mesmo procedimento será repetido posteriormente no TAP somente que diante de uma situação de estresse onde ele deverá fazer os mesmos movimentos só que abrigado e sob fogo. Com a adrenalina em alta ele terá que raciocinar em se abrigar e caso tenha havido uma pane trabalhar a sua arma para estar de volta ao combate com a arma em condições de tiro.

Desta forma, no início o aspirante aprendeu a municiar o carregador, fará a mesma coisa no TAP. Também aprendeu a inserir o carregador na arma. Ocorrerá o mesmo no TAP. Manobrará o ferrolho e irá inserir uma munição na câmara e assim estar apto a efetuar o disparo. Ocorrerá o mesmo no TAP. Efetuará o disparo. Assim como no TAP. Ocorrerá uma pane e o aspirante terá que solucioná-lo. O mesmo no TAP. No entanto a diferença existente entre uma ação e outra é que na primeira ele age sobre comando e na segunda lhe é explicado, refeito o treinamento para que assim aja com os seus reflexos automatizados e consiga, mesmo em condições de alto estresse, fazer aquilo que deverá diante de uma situação adversa conforme o quadro montado se lhe apresentar. São situações completamente diferentes, como por exemplo, no caso de uma pane ao adentrar um ambiente hostil, efetuar o primeiro disparo e a arma deixar de funcionar. O aspirante/policial sem nenhum comando irá se abrigar, chamar um companheiro para cobri-lo enquanto resolve o problema com sua arma de fogo.

Dito isto podemos afirmar que não existe nenhuma relação entre o primeiro treinamento com a arma de fogo e o segundo estágio que é um aprimoramento, mesmo se fazendo aparentemente a mesma coisa, apenas deixando claro da importância que é o primeiro contato com a arma de fogo e o aspirante se acostumar com esta situação. Quando acima digo que “não existe nenhuma relação” não quer dizer que é desimportante o primeiro contato com a arma, pelo contrário, sem este não se consegue chegar ao segundo estágio ou somente conseguiria chegar com um esforço muito maior pelo TAP. Apenas dizemos que são duas situações completamente distintas. Um é o tiro estático e outro é o tiro tático, em movimento e resolvendo por si mesmo os problemas que vai enfrentando na pista enquanto progride no terreno sem nenhum tipo de comando.

Podemos assim verificar que é o mesmo tipo de treinamento que o aspirante teve no início do seu aprendizado com a Pistola .40, no entanto em situação diametralmente oposta. Da mesma forma quando ocorre uma pane, aponta a sua arma para algum alvo, faz uma troca de carregadores, etc. Em todas estas haverá sempre um perigo a espreita e o aluno necessita estar preparado psicologicamente para se abrigar, se proteger e somente depois estar apto a responder aos disparos que estão indo em sua direção, preservando desta forma sua integridade física.

Assim quando falamos no treinamento do tiro tático vemos que não se guarda nenhuma relação ou pelo menos quase nenhuma com o tiro estático onde o aluno ainda está aprendendo a manejar o seu equipamento letal. Nesta, ele está apenas aprendendo como é que funciona esta máquina que “cospe fogo” e que se for usada indevidamente sem o devido treinamento poderá causar enormes transtornos jurídicos ao homem bem como à instituição que cairá em descrédito em relação à sociedade.

A continuação do treinamento com a arma de fogo é essencial na vida de qualquer policial, já que após o término do curso de aspirante ele receberá este equipamento e um porte para que possa usá-la de forma apropriada e somente o treinamento no TAP é que possibilitará esta oportunidade. Lembre-se que após a saída do curso inicial na ACADEPOL o aluno terá uma enorme dificuldade em retornar para fazer novos treinamentos já que a grande maioria é enviada para trabalhar no interior e a dificuldade para que isto venha acontecer com a periodicidade desejada é uma fantasia difícil de acontecer, pelo menos por enquanto que tenho certeza será este problema sanado em breve.

Mesmo os nossos colegas que já atuam há muito tempo nas ruas ainda sofrem da falta de um treinamento adequado, como temos visto nos últimos dias com fatos que aconteceram em nossa capital envolvendo Investigadores de Polícia da Homicídios.

É inconcebível que ainda haja por parte de poucas pessoas uma distorção do que seja o ensino policial e sabotem a própria instituição de que fazem parte dificultando o trabalho daqueles que somente querem o melhor para os nossos colegas. Dar o melhor treinamento possível para que eles não passem por dificuldades quando de um confronto armado ou mesmo percam a vida.

Isto somente poderá acontecer quando houver profissionalismo por parte daqueles que se aventuram a transmitir conhecimentos que somos demandados. Para isto precisamos nos despir de vaidades e assim construirmos um caminho mais seguro para aqueles que confiam em nossos ensinamentos.

Neste texto fiz um pequeno apanhado do que é ensinado dentro do TAP com relação ao treinamento tático já que temos diversas outras técnicas utilizadas pelas melhores escolas de polícia do mundo nesta área.

Um pequeno exemplo poderá ser visto no vídeo que iremos apresentar em breve e que serviu de mote ao treinamento do pessoal da DEOEsp – Divisão Especializada de Operações Especiais – quando do Curso de Investigação na Extorsão Mediante Sequestro, ocorrido no mês de agosto do corrente. Outras técnicas são ensinadas exaustivamente para que o policial tenha maior segurança quando do seu enfrentamento em um confronto armado e possa sair incólume pelo profissionalismo que deve ter em suas atitudes tanto como investigador ou como operador tático. Veja que no curso acima estamos falando daqueles policiais dentro de nosso estado que mais se envolvem em confrontos armados prendendo quadrilhas extremamente perigosas. Mesmo eles tiraram ensinamentos valiosos para os seus trabalhos posteriores. O que dirá daqueles que somente de vez em quando tem a oportunidade de utilizar suas armas de fogo.

Estamos à disposição para dentro do possível continuarmos aprendendo e disseminando estes conhecimentos e cobrando como contrapartida que alguns Professores do TAP periodicamente sejam encaminhados para treinamentos na TESS Brasil no PR e mesmo no BOPE ou na CORE no RJ, já que os diversos conhecimentos adquiridos por alguns destes para ensinar aos colegas mineiros o foram com as expensas próprias.

Aproveitando a oportunidade enfatizar mais uma vez sobre a necessidade no curso de formação para que na disciplina de TAP também tenhamos condições de utilizar as Pistolas .40 e com uso de munição real. Podemos dizer com certeza que os aspirantes não estão saindo em condições de portar este tipo de equipamento tendo em vista a insuficiência do treinamento na ACADEPOL, não por culpa de quem ensina os primeiros passos no uso deste tipo de armamento, mas sim da insuficiência do aprendizado que deveria continuar com o TAP o que atualmente não acontece. É uma irresponsabilidade que ao término do curso de formação o aluno receba uma Pistola .40 para trabalhar sem antes na verdade ter condições de usá-la tecnicamente e taticamente. Outra distorção é quando no curso de aperfeiçoamento e chefia os policiais não tem contato com o uso tático de armas de fogo, apenas repetindo os mesmos treinamentos feitos quando de sua formação. Não se anda para frente. Fica-se no mesmo lugar.

As ponderações feitas neste pequeno texto reiteram que são no sentido de criticar para auxiliar no melhoramento do ensino policial em nossa Casa de Ensino, sendo que mesmo afastado da lide diária de uma unidade policial por causa de minha aposentadoria ainda me preocupo sobremaneira com a qualidade daqueles que estamos colocando para trabalhar. Gostaria que vivêssemos num mundo perfeito e todas as sugestões acima elencadas seriam implantadas imediatamente, mas sabendo de todas as nossas dificuldades nem sempre isto depende da boa vontade daqueles que dirigem qualquer instituição pública. Existem enormes dificuldades a serem transpostas, mas pelo menos devemos estar sempre procurando a excelência na transmissão de conhecimentos que é a tônica da ACADEPOL/MG, sem nenhuma dúvida uma das melhores de nosso país.

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