quarta-feira, 21 de março de 2012

O Cinto de Segurança

A reportagem veiculada pelo Jornal da Rede Globo, Bom Dia Brasil, em data de 18/07/08, questiona acerca do uso do cinto de segurança pelos mais diversos tipos de profissionais que utilizam o carro como instrumento de trabalho. Entre estes, estão inseridos os policiais em seus veículos caracterizados, portanto no momento de seu trabalho diuturno.

As respostas, principalmente deste segmento profissional, policiais, são as mais disparatadas possíveis e não conseguem convencer nem mesmo a eles. Um dos argumentos utilizados é de que como o profissional está a trabalho, não pode ficar preso ao cinto. Utilizam este argumento, mas eles mesmos não acreditam no que estão dizendo. Como é que é isto? O cinto irá me impedir de ter uma reação rápida caso eu seja atacado? Seria isto o que ele gostaria de dizer? Vamos supor que sim. Os policiais, pela própria atividade, de risco, com certeza devem sempre estar atentos no veículo policial ou no seu particular. No entanto, isto nada tem a ver a não usar o cinto. Este é uma medida protetiva, é um dispositivo de defesa dos ocupantes de um meio de transporte.

A finalidade do cinto de segurança é para que no caso de uma colisão o seu ocupante não seja lançado para fora do veículo e nem que este bata a cabeça contra as partes do veículo como o pára-brisa. Ou seja, se o veículo sofrer um impacto, o cinto não irá permitir que as pessoas no interior do mesmo sofram uma segunda colisão contra a estrutura, como bancos dianteiros ou pára-brisa.

Mas voltemos aos policiais. Criou-se um mito de que o cinto de segurança é um empecilho ao seu trabalho, pois o mesmo deverá estar com seus movimentos liberados para agir mais rapidamente em caso de necessidade. No entanto não é isso o que eu entendo por segurança. Segurança é algo muito mais importante. Como professor da ACADEPOL/MG e diante de minha experiência, principalmente no combate a extorsão mediante seqüestro por toda Minas Gerais e outros estados, onde percorríamos enormes distancias em cada um dos casos, posso assegurar que a preocupação primordial é que antes de agirmos devemos estar em segurança. Nos diversos serviços efetuados pudemos constatar que a possibilidade de um acidente de trânsito está sempre presente em nosso dia-a-dia. Em 2003 perdemos três colegas, sendo um Delegado de Polícia, Dr. Lúcio Ivan e dois Agentes de Polícia, Milton e Alexandre, quando estes a bordo de um veículo, próximo a cidade de Araxá colidiram de frente com uma carreta. O único sobrevivente, Edy sofreu algumas escoriações e hoje continua firme trabalhando entre nós. Há, ia me esquecendo, o Edy estava afivelado ao cinto de segurança. Com certeza, você policial deve conhecer colegas que se envolveram em acidentes de trânsito e perderam a vida e ou tiveram ferimentos graves porque não estavam utilizando um dispositivo de defesa gratuitamente colocado a sua disposição.

Vejamos. Quando desconfiamos de um suspeito que esteja armado, a primeira coisa que devemos fazer é antes da abordagem estarmos abrigados, protegidos para que caso ocorra uma reação tenhamos condições de responder ao fogo com segurança. Portanto se vamos perseguir alguém utilizando uma viatura policial, a primeira preocupação nossa deverá ser a de nos protegermos, e isto se faz entre outras coisas com o cinto de segurança. O uso excessivo de velocidade poderá fazer com que sejamos envolvidos em um acidente de trânsito e se não estivermos utilizando o cinto de segurança seremos projetados contra o pára-brisa e perdermos a consciência ou até mesmo a vida.

Outra preocupação de nossos policiais é que estando com o cinto afivelado teríamos uma pronta resposta dificultada, o que também não me convence, já que a arma de porte (Pistola .40) estaria embaixo da perna e não na cintura onde passa exatamente o cinto e neste local ela estaria presa sem possibilidade de sacá-la em caso de emergência. Quanto à arma ofensiva ou longa, o cinto em nada impede nosso movimento de levar a coronha até o rosto para atirarmos, se for preciso. Por exemplo, quando atiramos embarcados em aeronaves (helicóptero), estamos devidamente seguros pelos nós e amarrações, que substituem o cinto de segurança dos veículos.

Outra, é que como a Polícia Civil trabalha na investigação, todas as nossas ações são anteriormente planejadas e, portanto sabemos onde e como devemos agir, não necessitando de que andemos sem o cinto de segurança.

Mais uma contraposição aos que ainda insistem em andar sem o cinto de segurança afivelado é que em caso de extrema necessidade, um simples toque no botão que prende o cinto e ele se solta imediatamente não havendo perda de tempo de reação, por isso que o policial deve estar sempre atento a todas as situações quando em trânsito para não ser pego de surpresa. E caso seja, rapidamente poderá agir, no entanto, se não dá tempo de soltar o cinto também não terá tempo de sacar a sua arma. Posso afirmar ainda que se o policial acostumar-se a andar com o cinto de segurança, facilmente acostumará também a retirá-lo de forma rápida.

Um problema quase idêntico, ainda hoje, depois de tantos e tantos acidentes é a dificuldade de fazer com que o policial utilize o colete balístico, em suas operações policiais apesar de ser ensinado exaustivamente nas aulas de TAP – Técnicas de Ação Policial em nossa academia. O policial pensa que é um super-homem até o dia em que é atingido, que o diga o subscritor deste texto.

Esta conscientização deveria estar presente em todos estes profissionais que tratam especificamente com a segurança da sociedade, mas se esquecem de sua própria até o dia que se envolvem em um acidente de trânsito, e aí, caso sobrevivam, terão o resto da vida para se lamentar.

Portanto não vejo e não conheço nenhum argumento que possa me convencer de que o policial não deva utilizar o cinto de segurança, não só os que transitam na frente, como os que também estão do banco traseiro. Evidentemente, quando estivermos para desembarcarmos ou, ainda que não seja nossa atividade precípua, patrulhando, portanto em baixa velocidade e prontos para desembarcar em alguma zona quente, poderíamos deixar de usar o cinto de segurança, mas friso, essa seria a exceção. Quantos policiais já perdemos em um confronto por estarem “presos” ao cinto? Não há nenhum relato em nosso estado a esse respeito. E quantos se foram por não terem tomado um cuidado mínimo de afivelarem-se ao cinto? Diversos. Conforme estatística dos Hospitais SARAH, especializado em atendimento neste tipo de acidente, sete de cada dez pessoas que chegam aquele nosocômio e viajavam no banco traseiro sem cinto sofreram LESÃO MEDULAR no acidente em que foram vítimas. Imagine os que estavam na frente.

Não devemos esquecer que o Código de Trânsito Brasileiro exige em seus artigos 65 e 167 o cinto de segurança, tanto para o condutor quanto passageiros e os policiais não são diferentes de nenhum outro motorista. Eles também têm a obrigação de seguir a legislação vigente em nosso país.

Elson Matos da Costa

Delegado Geral de Polícia

Coordenador/Professor de TAP

Técnicas de Ação Policial

ACADEPOL/MG

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